"a erudição deste não avultava mais que sua homeopatia de cantagalo” Dom Casmurro - Machado de Assis

Qual o papel das palavras em um texto? Palavras difíceis refletem arrogância e empolamento ou são necessárias?

Depende:

Tudo depende da finalidade do texto. Para uma mensagem rápida e importante, por exemplo, quanto mais simples e conhecidas as palavras, melhor.

E no texto literário?

O fundamento do uso de palavras não cotidianas na literatura não é deixar o texto mais bonito ou fazer seu escritor parecer mais inteligente.  Quando usadas com esse propósito, seu único resultado é um texto empolado e, por consequência, ruim.

Saber utilizar as palavras, contudo, é essencial para um bom texto literário. Quanto melhor encaixado o vocábulo no que se quer dizer, mais eloquente será o texto, mais rica a mensagem e mais revelador para o leitor. E esse é um dos propósitos da literatura, trazer o novo, fazer pensar por outros caminhos, abrir horizontes. “Belo”, “legal” e “preocupado” não dizem muito mais do que a linguagem ordinária, o que não significa que não possam ser usadas. Mas em um texto mais complexo, poderá haver palavras mais apropriadas, cujo significado é mais específico com relação ao que se quer dizer.

Palavras revelam o mundo!

Um vocábulo bem aplicado pode substituir uma frase inteira, ou mesmo pode apresentar ao leitor algo que ele nem sabia existir. Isso aconteceu comigo ao conhecer a palavra “idiossincrasia”. Ela significa que cada pessoa tem uma forma própria de reagir aos estímulos externos. É muito utilizada na medicina para demonstrar a forma específica e pessoal com que cada um reage a um medicamento. Para mim, revelou toda a complexidade particular e única da minha existência. Conhecer as palavras também tem um propósito mais singelo: tornar o texto menos repetitivo e mais rítmico. Muitas vezes não nos preocupamos com isso, mas o texto em prosa, não somente o poético, tem também um ritmo inerente, que torna a leitura mais agradável, mais fluida. 

O universo do dicionário analógico:

Mas nem sempre conhecemos as palavras das quais precisamos e, às vezes, o processo de busca pelo vocábulo de encaixe perfeito é uma descoberta mesmo para o escritor. Um dicionário analógico ajuda muito, apresentando palavras similares a uma já conhecida, mas com outros vieses de significado. Conheci esse tipo de “Dicionário de ideias afins” na escola, quando me foi apresentado o livro com esse nome, de Hermínio Sargentim, e isso mudou a perspectiva pela qual eu via as palavras. Eu que as conhecia a partir de livros que eu já tinha lido, poderia encontrar minhas próprias palavras, para dizer as minhas próprias coisas.

Segue o dicionário que uso atualmente: AZEVEDO, Francisco Ferreira dos Santos. Dicionário analógico da língua portuguesa. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lexikon, 2010. Uso também dicionários antigos, nos quais é possível encontrar significados mais puros das palavras. Vá a um sebo. Conhecer o significado de prefixos e sufixos também ajuda a trabalhar de forma mais confortável com a linguagem e construir um bom texto. Ter contato com a estrutura de uma língua estrangeira pode também ser revelador, especialmente se ela tiver a mesma origem. No caso do português, o italiano e o francês são ótimas pedidas.